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quinta-feira, 7 de junho de 2012

A PRODUÇÃO DO FRACASSO ESCOLAR

TÓPICOS PRINCIPAIS

1-No início dos anos 70 (EUA),a explicação da desigualdade educacional entre as classes sociais apoiava-se na idéia da "teoria de carência cultural" para explicar que as crianças de classe social "baixa" e "media" se desenvolviam de forma desigual devido às diferenças de ambientes culturais às quais pertenciam,produzindo deficiência no desenvolvimento psicológico infantil,causando dificuldades na aprendizagem e adaptação escolar.

2-Esta versão encontrou aceitação no Brasil devido à visão não-negadora do capitalismo,em que a incapacidade de pobres,negros e mestiços reforçava as "explicações do Brasil" que,de acordo com o subdesenvolvimento econômico ressaltava sua pobreza e malezas,cuja reversão era proclamada como imprescindível ao "milagre brasileiro".

3-Esta ideologia levantava a bandeira da valorização do homem,através do atendimento da criança em suas necessidades básicas,explorando sua potencialidade de inteligência como mística desenvolvimentista - teoria do capital humano - com atenção à extensão da escolaridade e aplicação da tecnologia à organização do ensino,baseadas na pedagogia "inglesa",de modo ao que o Poder público estudou diretrizes de uma política educacional em que se priorizasse o rendimento da "criança excepcional",em nome do "processo evolutivo da espécie em graus de complexidade crescente".

4-Nessa época,muitos pedagogos e psicólogos brasileiros se mostravam seduzidos pela literatura norte americana que enfatizava a "ausência de cultura" como ideia de que termos como "privação,carência e deficiência cultural" deveriam ser substituídos por "marginalização cultural".Essa era uma assimilação acrítica de uma teoria cultural exportada pelos E.U.A,em que os pesquisadores brasileiros em seus meios acadêmicos se vêem presos em uma poderosa armadilha ideológica e de consequências dramáticas.

5-Estudos,explicações e soluções são mergulhadas nas informações fornecidas pela psicologia educacional funcionalista norte americana,a respeito das crianças e famílias de baixa renda,com afirmações e idéias equivocadas de comprovação e preconceitos esteriotipados,numa tentativa de resolução da fratura contida na visão do fracasso escolar,no mais puro estilo do "as causas estão na escola "X",as causas estão na clientela "Y" e a escola é inadequada para as crianças carentes",etc.

6-A professora primária é preconizada como portadora de um despreparo técnico decorrente de uma formação pedagógica inadequada,,despreparada para ensinar criança carente,sobretudo em função de sua origem social-desencontro cultural -dando margem a todo tipo de reflexões e propostas,tais como a intocabilidade das culturas regionais e feitura de cartilhas regionais de guias curriculares equivocados.

7-A "teoria da diferença" é sub-jugada pela "teoria do déficit",pois a tese da diferença continha sutilmente a tese da deficiência.Nesse contexto,os esteriótipos e preconceitos estão presentes nas análises e formulações de propostas para mudanças de dimensões estruturais e funcionais do sistema de ensino.

8-Vivia-se nessa época,a obsessão meritocrática de que haviam sido tomados os cientistas e filósofos liberais que se ocupavam das questões educacionais,estabelecendo no Brasil,dois sistemas escolares paralelos,fechados em compartimentos estanques e incomunicáveis,diferentes nos seus objetivos culturais e sociais e instrumentos de estratificação social:o ensino primário e profissional,secundário e superior.

9-O ensino secundário era o ponto nevrálgico da questão: priorizava-se que ele deveria ser unificado em seus três primeiros anos,com o objetivo comum a cultura geral,para evitar o divórcio entre trabalhadores manuais e intelectuais,pretendendo destruir os obstáculos opostos pela escola tradicional á interpretação de classes,satisfazendo as necessidades práticas de adaptação á variedade de grupos sociais.Esta era uma argumentação desenvolvida verdadeiramente em um terreno movediço.

10-Disfarçada em verdade cientifica,o ensino secundário é construído sob discurso educacional que,na prática,dicotomiza as faculdades e aptidões das classes trabalhadoras,como se elas fossem inferiores e como se seus integrantes tivessem como vocação o trabalho braçal,em que aqueles pertencessem ás classes privilégiadas fossem educados para dirigirem e aqueles pertencentes ás classes inferiores,para serem dirigidos.

11-Essa concepção baseava-se na interferência maciça dos E.U.A na política educacional brasileira,que preconizava o fato de que "não se pode confundir igualdade nas urnas com igualdade na escolaridade",pois existem diferenças individuais de habilidade e aptidão.A escola primária urbana brasileira cai de sete para cinco e depois para quatro anos,num disciplinamento da clientela de origem popular para o ensino secundário,pois pelo processo de "peneiramento" natural,só conseguiriam atingir o ginásio,os mais aptos e mais capazes para este tipo de ensino.

12-Segundo idéias norte americanas,"os dons do intelecto procedem de Deus e o homem não pode impedir sua distribuição desigual".No limiar dos anos sessenta,assistia-se a um nítido retrocesso na explicação das  causas das desigualdades sociais;"quem não vence na escola ou na vida pertence ao contingente dos intelectuais deserdados pela vontade divina".

13-A situação do ensino brasileiro é então ,alvo de críticas duras.Nos últimos 50 anos o índice de evasão e repetência na escola pública é alto e de problemas básicos que continuam intocados,apesar das intenções demagogicamente proclamadas por tantos políticos e dos esforços sinceramente empreendidos por muitos educadores e pesquisadores.São convicções que se arrastam através de um labirinto de idéias vagas,fora de seu alcance,permeado por palavras de discursos manejados.

14-Currículos são enfatizados e caracterizados pela prescrição de disciplinas formais,de transmissão de conhecimentos por simples técnicas mnemônica,como se a tarefa importante em aprendizagem fosse a aquisição da habilidade de responder a perguntas.Isto impede a profissionalização consciente e honesta da função docente,formalizando-os,burocratizando-os no pior sentido.A não ser um mau ensino de leitura e da escrita,o resto é mais ou menos "simples passar de leve" por noções que as crianças não assimilam e não lhes apreendem a função prática ou teórica.

15-Chega-se assim,a uma escola que não é nem educativa,nem instrutiva,nem intelectualista;é simplesmente uma rotina apressada que torna impraticável qualquer iniciativa nova e que leva á estilização superficial dos exercícios escolares.E isto é certo e aplicável ás realidades atuais do ensino público.O termo calamidade no ensino é válido,pois que tal situação demagógica e política é senão um reflexo de nossa realidade educacional.

16-Outro absurdo: a promoção automática.Tema tão atual quanto controvertido,serve de argumento demagógico de base,sobretudo a políticos comprometidos ás estatísticas falsas e comprometedoras,maquiadas por esse instrumento tomado como verdade enquanto fato antidemocrático.Desdito e mentiroso,espelha paradoxos terríveis quanto a desmedida prática;tornou-se uma aventura política,emblemática quanto a sua aplicação e equivocada quanto ao seu juízo.

17-Há uma alta correlação positiva entre classe social e escolaridade;num país no qual tradicionalmente as causas do fracasso escolar foram localizadas em características bio-pisico-sociais do aprendiz,no contexto de uma concepção funcionalista de vida social,estava aberta a porta para a teoria de carência cultural,discurso este,de cunho educacional dos anos setenta.

18-A educação é baseada numa concepção interacionista de desenvolvimento:se atribui igual peso á influência da maturação física e da estimulação ambiental no desenvolvimento das capacidades e habilidades necessárias á aprendizagem da leitura e escrita;primeiras prescrições dos remédios para reverter a "privação cultural",fiéis á idéia de educação compensatória.Eram tempos nos quais vigorava a tese da "disparidade cultural" como explicação do fracasso escolar.

19-As características psicológicas das crianças pobres dos anos setenta oscilavam entre a tese do déficit e da diferença:o aluno -proveniente em sua maioria,de ambientes econômica e culturalmente desfavorecidos,que não tem possibilidade de lhe proporcionar a estimulação e os treinamentos necessários a um bom desenvolvimento global -Chega á idade escolar sem condições de cumprir o que a escola exige dele.

20-Esse era o apogeu do discurso da teoria da carência cultural.A causa principal do fracasso encontrava-se no aluno,cabendo á escola uma parcela de responsabilidade por não se adequar a este aluno de baixa renda.Havia também a falta de preparo do professorado,urgência de capacitação do,corpo docente em decorrência do despreparo do discente:30% dos professores tem apenas 3 ou 4 anos de escolaridade:86% das professoras de classe única são leigas.

21-A dominação cultural, a ideologização a serviço da reprodução das relações de produção,ambos são característicos dos integrantes das classes dominantes,que faria do sistema de ensino instrumento a serviço da manutenção dos privilégios educacionais e profissionais daqueles que detêm o poder econômico e capital.O conceito dominação nem sempre é apreendido como contrapartida cultural da exploração econômica inerente a uma sociedade de classes regida pelo capital.

22-"Capital cultural",em termos de fracasso escolar,era sinônimo de desenvolvimento psicológico consoante com os critérios de uma psicologia normativa,com considerações de desenvolvimento deficitário em que o imediatismo e o viver sem regras eram características atribuídas ás populações carentes;tomadas de forma acríticas por pesquisadores brasileiros,enfatizando o significado sócio-cultural das classes pobres num visão esteriotipada e negativa,imputando o fracasso na inadequação da escola a esta criança carente ou diferente.

23-Inicia-se,então, um processo de marginalização que é realizado inconscientemente através do desconhecimento total das professoras - na grande maioria pertencentes á classe média -sobre a população de alunos com a qual estão lidando.

24-Apesar da extensão da escola ás massas populares desfavorecidas,essa escola não sofreu mudanças significativas em sua atribuições na reprodução das desigualdades sociais.No passado,a exclusão atingia os que não ingressavam na escola;hoje ela atinge os que nela chegam,operando,portanto,de forma menos transparente,como altos índices de evasão nos primeiros anos de ensino.

25-A inadequação da escola á realidade da clientela é uma das conclusões sobre o fracasso escolar.Esse discurso fraturado predominou num período em que vigoravam as idéias escolanovistas,quando não repete a tentativa de colagem deste discurso afirmando que a escola que aí está é inadequada á clientela carente.

26-As dificuldades de aprendizagem escolar da criança pobre decorrem de suas condições de vida.Esse pensamento encontra-se em plena circulação no pensamento educacional -pura influência da teoria da carência cultural.As condições escolares são hoje mecanismos de seletividade poderosos.Grande parte desse fracasso se deve,sem dúvida,á pobreza material de que essas crianças são vítimas;produzidas por condições de vida incompatível com o desempenho bem-sucedido-teria do déficit.

27-No período de quase um século,portanto,mudam as palavras,permanece uma explicação:as crianças pobres não conseguem aprender na escola por conta de suas deficiências,sejam elas de natureza biológica,psíquica ou cultural.E,baseado na teoria de diferença cultural,a escola pública é uma escola adequada ás crianças de classe média e o professor tende a agir,em sala de aula,tendo em mente,um aluno ideal.

28-Mesmo quando a fundamentação teórica deixou de ser não-crítica para ser crítico-reprodutivista e, pouco depois,crítica,a distância cultural entre a escola e sua clientela majoritária,a primeira se tornou estranha á segunda,exigindo a verificação do grau de adequação entre as propostas e orientações curriculares,a forma de trabalho do professor e as características da clientela,aliadas ás informações sobre o nível psicológico das crianças cujos padrões são voltados a conceitos ideais,não reais,atribuem -erroneamente -á falta de "capital cultural" ao fazer frete ás exigências da escola.

29-É necessária especial atenção quanto ao conhecimento ou desconhecimento que os professores tem em relação á visão quanto ao entendimento e discriminação dos padrões culturais da classe pobre,baseados na visão de sua classe média,por puro preconceito,enfatizando equivocadamente falsos juízos de valores.

30-O processo de construção do conhecimento,ainda que relacionado com todo social,não se confunde com barganha política.Há muito que fazer na área da pesquisa educacional.Para que os erros do passado não continuem a se repetir,é fundamental reexaminar a questão do método,apesar de impasses no discurso acadêmico da educação quanto ao fracasso escolar,onde o concreto e o empírico são confundidos de forma,não rara,a vivermos numa realidade educacional dominada e segmentada por "variáveis".

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